40 anos do rock brasileiro: a mesma linguagem em qualquer idade
Dando sequência ao especial Rock Brasil 40 Anos, produzido pelo Versos e Prosas, em referência ao movimento vanguardista que mudou, para sempre, a linguagem e o formato da música brasileira, a gente traz o depoimento de 12 dos maiores nomes da época, que construíram, de fato, aquele movimento que, na visão dos próprios artistas, alterou a forma de se fazer música no país.
Arnaldo Brandão, Evandro Mesquita, Nasi, Leoni, Leo Jaime, Charles Gavin, Marcelo Hayena, Vermelho do 14 Bis, Da Ghama, Cícero Pestana, Clemente e Affonsinho Heliodoro discutiram esta ruptura, sem deixar de valorizar outros movimentos, tais como a Jovem Guarda, a Tropicália e o Clube da Esquina, que, na visão deles, colaboraram bastante para o que, hoje, se denomina Rock Brasil Anos 80.
Confira, com o Versos e Prosas, a impressão de cada um dos nomes e, acompanhe, na íntegra, o depoimento dos artistas, no canal do YouTube do Versos e Prosas.
Arnaldo Brandão: ‘trabalhos de alta qualidade musical e poética’
O cantor, compositor e baixista, fundador do Hanoi Hanoi, Arnaldo Brandão, que participou de maneira muito direta do movimento do Rock Brasil Anos 80 dá a sua visão daquele processo. Ele cita questões históricas e a influência de outra banda que, tal sua Hanoi Hanoi, abriu as portas para o rock da época:
“Com a abertura política e o início do fim da censura, e uma vontade enorme de liberdade das pessoas, fez com que vários jovens, artistas não só na música, mas também nas artes plásticas, no teatro e no cinema, se juntassem e começassem a fazer trabalhos de alta qualidade musical e poética, liberando forças que estavam reprimidas pela ditadura, de uma maneira muito espontânea e criativa, que acabou criando esse movimento, que hoje a gente chama de Rock Brasil Anos 80. Na verdade, teve um gatilho que proporcionou a abertura para todas as bandas, foi o fato de a Blitz ter sido aceita nas rádios FM, e a música Você Não Soube me Amar ter estourado nas rádios. Isso fez com que as portas da caretice fossem escancaradas de vez e abriu para várias outras bandas fazerem rock, de alta qualidade musical e poética, de uma maneira espontânea, livre, criativa”, relata.
Evandro Mesquita: ‘foi demais romper essa barreira’
O cantor, compositor e ator Evandro Mesquita, vocalista e líder da Blitz, também falou sobre a influência de sua banda e de outros nomes da época, que, ainda hoje, colaboram para esta miscigenação em nossa música:
“A música era uma coisa tão distante de tudo que tocava na rádio, do que se apresentava na TV, que a gente achava que era só para aqueles amigos da praia mesmo. Então, foi demais romper essa barreira, numa época horrível de ditadura, de censura. A gente ficou muito contente com essa atitude de guerrilha mesmo, de invadir uma gravadora com uma fita cassete, e mostrar o nosso trabalho, os caras darem valor, abrirem os estúdios da Odeon para a gente gravar. Então, isso tudo foi um mérito da galera que veio do underground e conseguiu furar essa bolha, mostrar o que essa gente bronzeada sabe fazer!”, relatou o vocalista da Blitz, que completa 40 anos em 2022.
Nasi, do Ira!: ‘colocou o rock no DNA da música brasileira’
O cantor, compositor, produtor musical, apresentador e vocalista do Ira! Também falou sobre a importância do Rock Brasil Anos 80 para a música brasileira. Para ele, aquela geração marcou história, que não se apaga:
“O pessoal da década de 80 colocou, definitivamente, o rock no DNA da música brasileira. Eram tempos de abertura política, fim da ditadura, da censura, e uma nova geração trouxe novos ares à música brasileira. Uma época de muita esperança no Brasil, grandes artistas, todos com personalidades diferentes, que marcaram história e são lembrados até hoje! E o Ira! É um deles!”, relata.
Leoni: ‘a gente criou uma linguagem que não existia’
Leoni, cantor, compositor, ex-integrante do Kid Abelha, também falou, ao canal do YouTube do Versos e Prosas, sobre suas impressões a respeito do Rock Brasil 40 Anos:
“O Rock Brasil nasceu do movimento punk, New Wave. Já tinha rock no Brasil, mas era bastante marginal, dar certo mesmo foi só a Rita Lee, Raul Seixas, o Erasmo (Carlos), o resto era tudo muito underground. E, com o surgimento do punk, de repente a garotada que achava que era impossível fazer rock, porque não iria conseguir chegar na perícia, na técnica, das bandas de rock progressivas, o próprio Led Zeppelin, que era um rock mais básico, mas de qualquer maneira tinha grandes instrumentistas, e o punk liberou a gente para fazer do nosso jeito! E era um momento de emergência, a gente tinha que falar coisas! Era um momento de ditadura, apesar de já ser um momento de distensionamento da ditadura, mas a gente queria falar coisas que não eram possíveis antes. Eu acho que a gente criou uma linguagem, que não existia antes, e essa linguagem não ficou restrita ao rock. Ela foi herdada por todo mundo. O pagode aproveitou essa linguagem mais direta, o sertanejo hoje em dia também se influenciou muito da linguagem do Rock Brasil. Eu acho que são 40 anos de uma ruptura, que depois, deixou de ser ruptura, passou a ser uma convivência muito bacana!”. Confira outras notícias diversas conosco.
Na sequência, ele cita nomes como Novos Baianos, Gilberto Gil, Luiz Melodia, que, de alguma maneira, beberam na fonte do rock, embora não seja o estilo único destes artistas. Por fim, ele reforça essa união entre os estilos e fala de uma convivência muito saudável na Música Popular Brasileira.
Leo Jaime: ‘o que não parecia durar um verão, agora completa 40 anos’
O cantor, compositor, escritor, ator e jornalista Leo Jaime comentou sobre o movimento vanguardista do rock brasileiro e, de acordo com ele, o que não parecia ter futuro, para os críticos, já dura 40 anos e segue fazendo história:
“O que parecia, segundo a visão crítica, que não duraria mais que um verão, agora completa 40 anos! A geração, chamada de Rock Brasil, se mistura com a geração 80 das artes plásticas, um movimento que envolveu a literatura, a dança, o teatro, aquilo que era chamado de besteirol também, de uma forma um tanto depreciativa, mas uma linguagem popular jovem urbana brasileira, bem-humorada, rebelde, iconoclasta, fez da Música Popular Brasileira, do Rock Brasil, a sua voz principal, mas era um movimento que incluía todos os setores culturais, e que coincidem com a abertura, o fim da ditadura, e com a necessidade da juventude brasileira de criar uma voz própria: bem-humorada, esperançosa, colorida, dando ocres ao Brasil, que antes vinha com cores de chumbo! Eu me orgulho de fazer parte e acho que o meu trabalho está inserido ali como um operário da cultura, em um movimento que é muito bacana, que faz parte do nosso repertório, da nossa cultura!”.
Charles Gavin: ‘é inquestionável a importância da nossa geração’
Charles Gavin, que foi baterista dos Titãs entre 1985 e 2010, deu sua colaboração, não apenas ao Rock Brasil Anos 80, mas também ao reverenciá-lo, aqui no Versos e Prosas. Ele fez questão de citar bandas antecessoras ao movimento, que ele julga ter grande influência para aquela geração:
“Eu acho que é inquestionável a importância, a relevância da nossa geração e da música que nós produzimos e continuamos a produzir. Nós somos uma geração bastante diferente, obviamente, da geração que nos antecedeu, do rock brasileiro, geração que também nos influenciou, com algumas das principais bandas desse período, como Mutantes, Rita Lee e Tutti Frutti, Casa das Máquinas, O Terço, Som Nosso de Cada Dia, Made in Brazil, Joelho de Porco, Bicho da Seda, depois Patrulha do espaço e muitas outras, algumas surgidas até nos anos 60 e que chegaram até o final dos anos 70”, destaca Gavin.
Lembrando que ele gravou seu depoimento de dentro de seu Fusca 1968.
Marcelo Hayena: ‘falar a linguagem do jovem, de igual para igual’
O vocalista da banda Uns e Outros, Marcelo Hayena, também falou sobre a importância e as influências que o Rock Brasil Anos 80 teve e segue exercendo na música brasileira:
“Eu acho que a maior contribuição do rock para a música brasileira foi, justamente, falar a linguagem do jovem, falar de igual para igual, e numa mesma linguagem, com mensagens contundentes e de uma forma diferente. Eu acho que o momento sociopolítico também proporcionou que a gente pudesse se expressar de uma forma mais livre. Apesar de, no começo ter uma censura, mas, em muitos aspectos, o rock nacional contribuiu, de forma muito grandiosa, com a música nacional, com a música brasileira. E eu me orgulho muito de fazer parte disso!”, vibra.
Vermelho: ‘o 14 Bis não está incluído, não sei porque’
O tecladista, compositor e arranjador, Vermelho, da banda 14 Bis, foi outro integrante da geração dos anos 80, que exaltou não apenas aquele movimento, mas a música brasileira como um todo. Inclusive, ele questiona porque muitos especialistas, que abordam aquela geração, não incluir o 14 Bis no movimento. E você acha que ele se importa?
“Quando os caras falam em rock dos anos 80, geralmente o 14 Bis não está incluído, não sei porque?! Talvez porque, o Cláudio Venturini define muito bem. Quando a gente vai tocar num festival de MPB, o pessoal fala assim: ‘Não, não chama o 14 Bis não, porque eles vão ligar a distorção’. Se a gente for tocar num festival de rock, o pessoal fala: ‘Não chama o 14 Bis não, senão eles vão tocar Todo Azul do Mar, Espanhola etc. e tal’. Então, ficou essa coisa. Os livros que escrevem sobre rock, geralmente não inclui o 14 Bis. A gente não está nem aí! Na verdade, eu considero que a gente faz uma espécie de Rock da Esquina, que é uma mistura do rock mesmo, com a influência do Clube da Esquina”, destaca.
Em seguida, assim como Leoni, Vermelho cita os Novos Baianos, que segundo ele, “tocava uma mistura de rock com música baiana maravilhosa!”.
Da Ghama: ‘salve o rock brasileiro, salve a música brasileira’
O intérprete, compositor e guitarrista, um dos fundadores do Cidade Negra, Da Ghama, também falou, com muito carinho, não apenas do rock brasileiro, mas da música brasileira como um todo:
“Sua participação na música brasileira, para mim, é muito importante, até porque o rock contribuiu muito, uma geração que passou a pensar, ou seja, veio o pós-ditadura, anos 80. A partir daí, as bandas puderam se expressar, com muito mais contundência, com muito mais liberdade. Salve a democracia! Salve o rock brasileiro! Salve a música brasileira!”, exalta o guitarrista.
Cícero Pestana: ‘podia fazer uma festa, só com música nacional’
O vocalista e guitarrista da banda Dr. Silvana & Cia., Cícero Pestana, falou, para o YouTube do Versos e Prosas, sobre a importância do movimento do rock brasileiro dos anos 80. Para ele, se podia, em uma festa, ouvir apenas músicas nacionais, daquela época:
“Eu considero que foi o último movimento de música brasileira, válido. Dos anos 60 para cá, tivemos a Bossa Nova, a Jovem Guarda, a Tropicália, e alguns outros movimentos, que culminou nos anos 80, com o movimento do Rock Brasil. Eu costumo falar que é uma época que a gente podia fazer uma festa, só com música nacional, todo mundo sabia cantar, dançar e curtir todas aquelas músicas. Tanto é que elas são válidas até hoje!”, acredita o artista.
Clemente: ‘o rock sempre esteve presente na música brasileira’
O DJ, produtor, cantor e guitarrista, fundador da banda Inocentes e integrante do Plebe Rude, Clemente, também deu seu depoimento sobre o Rock Brasil, que completa 40 anos neste 2022:
“O rock sempre esteve presente na música brasileira, desde a década de 1960. No começo da década de 60, final da década de 50, mas foi na década de 80 que ele se consolidou, como um estilo popular e que vendia muito. É claro que sempre houve uma influência de mão dupla, entre a MPB e o rock, um influenciando o outro, um trazendo linguagens que eram adotadas pelo outro. O rock da década de 80 se consolidou, porque conquistou um mercado muito grande, um mercado jovem”, diz.
Affonsinho: ‘foi uma experiência muito legal’
O guitarrista, cantor, compositor e produtor Affonsinho Heliodoro (ou apenas Affonsinho), que hoje segue carreira solo, e integrou, na década de 1980, o Hanoi Hanoi, ao lado de Arnaldo Brandão, contou toda a história da formação da banda, os primeiros shows e os primeiros discos:
“Eu tive a oportunidade de conhecer mita gente, de trabalhar com muita gente no Rio, fora do Rio, no Brasil todo, de gravar, de fazer programa de televisão, de fazer show, de aprender técnicas de gravação, num estúdio profissional. Foi uma experiência muito legal. O Hanoi tinha uma característica de banda muito legal, que era um pouco diferente do estúdio, da banda ao vivo, porque eram três influências musicais na banda: o Arnaldo (Brandão), com essa coisa do rock dos anos 70, com influência do funk americano, influência do reggae, dos baianos, que ele tocou com Caetano, n’A Outra Banda da Terra; o Pena, era um baterista de rock pesado, uma coisa legal para uma banda de rock, era ter um baterista que tocava pesado, ele tocava pesadão, ele era mais do metal; e eu entrei com a contribuição do blues, da guitarra blues, muita gente que eu ouvi dos anos 60. Então, o Hanoi virou essa mistura”.
Ele também citou a troca de experiências entre artistas da MPB e do Rock Brasil.
Para conferir, na íntegra, os depoimentos dos 12 artistas, participantes ativos do Rock Brasil Anos 80, acesse o canal do Versos e Prosas no YouTube.
Comente, aqui conosco, quem mais você gostaria de assistir, contando sobre o rock e a época a qual participou?