História da música Vaca Profana de Caetano Veloso, famosa na voz de Gal Costa

A canção Vaca Profana ganhou o Brasil na voz inconfundível de Gal Costa em meados dos anos 80, mas foi na composição de Caetano Veloso que realmente mostrou sua força, exibindo todo o potencial  poético em uma letra enigmática e disruptiva.

Quer saber mais sobre os bastidores dessa canção compartilhada por dois ícones da música brasileira, suas origens, inspirações e repercussões pelo país? Então continue lendo, vamos te contar a história dessa música emblemática  logo abaixo.

História da música Vaca Profana

A história de Vaca Profana começou na Europa, onde foi idealizada por Caetano Veloso, e ganhou curso em terras brasileiras na Voz de Gal Costa, como primeira faixa do álbum Profana, lançado em 1984.

Gal também foi a figura central da canção, encomendando a música  pessoalmente ao amigo, e sua imagem pública se  tornou parte da inspiração original, segundo comentários do próprio cantor.

Apesar de ter ganhado uma versão acústica cantada pelo próprio Caetano no álbum Totalmente Demais, de 1986, a música ganhou força  apenas com a interpretação de Gal,  que incorporou sua personalidade à melodia, apimentando ainda mais os traços disruptivos da letra.

Com uma mistura de contextos culturais diferentes e referências claras à Espanha, além de uma letra de significados dúbios, a canção permanece enigmática até hoje, abrindo possibilidades de interpretação inesgotáveis para públicos muito diversos.

Apesar disso, a música se tornou símbolo da crítica aos padrões sagrados e disrupção de convenções estabelecidas. Nada mais adequado à personalidade dos artistas que a conceberam.

Uma ode de Caetano a Gal Costa

Em seu livro Sobre as letras, lançado em 2003, Caetano conta um pouco das origens de criação  de Vaca Profana, comentando sobre os refrões mutantes e sua intenção em tornar a música uma canção sobre Gal, o que pode ser percebido nas alegorias em volta da figura do animal ao mesmo tempo profano e divino, que dá título à música. Confira outras histórias das músicas conosco.

A fama e personalidade que rodeavam a carreira da cantora na época, servem como referência ao aspecto de uma deusa para  seus súditos, sejam eles reais ou metafóricos, não muito diferente da relação entre um artista e seus fãs.

A profanidade das imagens, característica também incorporada por Gal em sua presença artística, repete o tema da disrupção, e cria conexão muito próxima entre artista, música e performance.

Com isso, há quem diga não haver distinção entre a cantora e as imagens que canta na música, ou mesmo na conexão entre às duas feita pelo compositor, mas a gama de interpretações vai muito, além disso, fruto de uma pluralidade de referências.

Referências enigmáticas e multiculturais

No auge da sua formação como artista, Caetano não mediu a criatividade para criar referências culturais diversas, recheando a canção com trechos enigmáticos que no fim das contas relevam muito das  raízes e inspirações musicais do próprio cantor.

No decorrer de Vaca Profana, encontram-se referências a:

• Cultura Espanhola . Fruto da passagem do cantor pelo país, podem ser percebidas nas imagens e termos do movimento cultural da Espanha presentes na letra, e mesmo no trecho cantado em espanhol.
• Música e Cultura Americana. Presentes nas citações à New York e Thelonious Monk, um grande compositor de Jazz.
• Picasso e a arte cubista. A referência ao pintor aparece em dois momentos na música, mostrando a predileção de Caetano pelo artista.
•   Cultura Brasileira e regiões do Brasil.  O cantor também faz menção às suas origens brasileiras, falando sobre o Rio de Janeiro , Belo Horizonte e a Bahia, sua terra natal.

Outras referências também podem ser encontradas nas entrelinhas, como a própria figura de uma vaca divina, imagem que é parte recorrente da cultura Indiana, onde esses animais são vistos como sagrados.

Repercussão da música na época

Com a proposta original do disco Profana, Gal Costa surfava na onda dos novos movimentos do MPB que tomavam forma, e a luta contra a ditadura também se anunciava, tornando aquele um período turbulento e criativo para os artistas brasileiros.

Talvez por conta disso, Vaca Profana recebeu reações diversas, fazendo sucesso com a gravação da cantora em um especial da Globo em 1984, e se tornando uma das suas músicas mais emblemáticas.

Ao mesmo tempo, a canção acabou recebendo censura pública por alegações de que feria a moral e os bons costumes da época, comprovando o barulho que fez entre o público e as autoridades.

Ao longo dos anos, a canção também ganhou repercussão entre os artistas, sendo gravada e cantada por outros músicos brasileiros, como Simone Mazzer, Ana Carolina e Maria Gadú, esta última em parceria com Caetano em uma gravação Ao Vivo.

Análise da letra da canção

A primeira vista, a letra de Vaca Profana não parece fazer sentido, com versos separados e estrofes cheias de referências, mas o ouvinte atento pode perceber mudanças sutis que indicam que existe mais ali do que simples versos soltos.

Pela progressão dos versos do refrão, uma mudança na perspectiva do eu lírico sobre si mesmo e sobre o mundo vai lentamente se mostrando, refletida por trechos como:

“Ê, ê, ê, ê, ê,

Dona das divinas tetas

Derrama o leite bom na minha cara

E o leite mau na cara dos caretas”

Nesse trecho, que se repete nas primeiras estrofes, percebe-se o tom de revolta do eu lírico em relação aos ditos “ caretas”, aqueles que o reprimem ou que considera inimigos. Porém, com a transformação de seu caráter, acabamos encontrando uma visão de compaixão nos versos finais, como pode ser visto nesses trechos:

Ê, ê, ê, ê, ê,

Dona das divinas tetas

Quero teu leite todo em minha alma

Nada de leite mau para os caretas

Ê, ê, ê, ê, ê,

Deusa de assombrosas tetas

Gotas de leite bom na minha cara

Chuva do mesmo bom sobre os caretas…

Dessa forma, com uma mistura de referências e imagens, a canção acaba falando sobre temas muito pessoais, ao passo em que também explora questões de autoridade e quebra de padrões, tornando-a tão poética quanto enigmática.

Breve histórico de Caetano Veloso

Com uma célebre carreira que já soma mais de 50 anos, Caetano Veloso é uma das figuras mais influentes da música Brasileira, com uma obra marcada pela carga poética e renovação, criando uma expressão artística extremamente original, ao lado de músicos como Gilberto Gil, Gal Costa e, é claro, a irmã, Maria Bethânia.

Nascido em Santo Amaro, na Bahia, o músico começou a carreira na década de 60, liderando o movimento conhecido como Tropicalismo, que renovou a música no Brasil, e desde então nunca parou de compor e criar, se tornando um ícone cultural de grande legado no país.

E então, gostou das curiosidades e referências de Vaca Profana, canção de Caetano Veloso, bastante famosa na voz de Gal Costa? Quer dividir sua interpretação da belíssima letra conosco? Fique à vontade. Para isso, escute a canção no player abaixo e comente conosco suas impressões!